domingo, 26 de junho de 2011

A promoção automática e o caos na educação

“Eis aqui algo que tem me deixado bastante desmotivada ao desenvolver meu trabalho como professora ACT das séries iniciais:

1- Não temos livros em número suficiente para que cada aluno tenha o seu e muito menos para que possa levar para casa como fonte de pesquisa de trabalhos e tarefas, pois ainda é preciso dividir com a turma do outro turno. Mas o professor está acostumado a se arranjar, vai a internet, busca outros livros, pesquisa o assunto, resume e passa pro aluno NO QUADRO (viva as cotas de Xerox) o que atrasa toda sua aula porque o tempo gasto para copiar já poderia estar sendo usado para debater, explicar o conteúdo, realizar atividades;
2- As salas de aula carecem de todo tipo de recurso: jogos para trabalhar matemática, português, geografia, não há NADA de lúdico! Mapas atualizados, recursos visuais, Tv, Dvd, aparelho de som para cada uma: NADA! Sendo que seria o mínimo que o estado deveria nos oferecer para termos condições de dar uma aula diferenciada e de qualidade. Assim, é preciso agendar aulas na sala de vídeo semanas antes, o que acaba frustrando nossas iniciativas, pois apesar de sempre termos nosso planejamento semanal, às vezes surge algo inesperado, um assunto novo na mídia ou achamos um vídeo que fala daquilo que estamos trabalhando …ah não tem mais horário. Quando queremos colocar uma música e solicitamos o aparelho de som na secretaria, dos 3 que tem, só 1 funciona. É assim que querem qualidade no ensino público? Sem comentar que não veio nem sequer um só lápis para dar as crianças e quem trabalha em áreas carentes sabe das necessidades.
3-O SISTEMA DE 9 ANOS- Eis para mim o CAOS TOTAL. Crianças de 6 anos em carteiras impróprias para seu tamanho, não há parques para brincarem, nem material lúdico para alfabetização. A impressão que fica é a de que o estado apenas TIROU AS CRIANÇAS DO ANTIGO PRÉ E AS “JOGOU” NA ESCOLA DE ENS.FUNDAMENTAL. Eu vi o sofrimento delas com as carteiras desconfortáveis o ano passado inteiro e pedia sempre para a direção ligar pra SED e pedir mesinhas, mas lá davam sempre a mesma resposta: não tem! Absurdo!
Mas além da falta de estrutura, há um problema maior ainda: A APROVAÇÃO AUTOMÁTICA. Em minha opinião, foi a pior coisa que já inventaram, não que eu ache legal reprovar uma criança, mas há casos em que isto é NECESSÁRIO. Neste novo sistema, a criança NÃO reprova no 1◦ ano, nem no 2◦ ano, nem no 4◦, e no 5◦ não sei até agora. Então o que vem ocorrendo é que muitas crianças estão chegando analfabetas ao 3◦ano, onde é permitido reprovar se não se apropriarem da leitura e escrita.Sinceramente neste ponto a defasagem já é enorme e fica muito complicado para um único professor dar conta de alfabetizar e ao mesmo tempo tocar o conteúdo próprio daquele ano com as outras crianças. Isso é uma tarefa árdua, exaustiva que exige do professor se virar em dois para dar conta do recado. Eu por exemplo vivo este dilema com um 4◦ ano onde tenho quem não lê nem escreve e mais alguns que são semi-analfabetos, escrevem e lêem muito mal, não sabem operações matemáticas básicas e cuja interpretação do que estão lendo então… Esse sistema de fato não está dando certo. A defasagem é enorme.
No tempo em que freqüentei o primário (1989 a 92) nenhuma criança saia da primeira série sem saber ler e escrever, na terceira então, tabuada na ponta da língua. Sempre fui muito exigida pelos meus professores e nessa época REPROVAVA SIM. Era nota de 0 a 10 e ponto final. Hoje estamos “modernos” com as tais AVALIAÇÕES DESCRITIVAS onde um dos fatores positivos é de permitir ao professor uma visão mais ampla do desempenho escolar do aluno, dos detalhes da aprendizagem de cada um. O aluno não é mais, apenas um número. Porém, nesta avaliação descritiva, o professor passa dias analisando aspectos de cada disciplina para ver se o aluno atingiu o objetivo, ou seja, se ele se apropriou do conteúdo trabalhado. Daí passa tudo para uma tabela onde marca x de acordo com o resultado Atingiu (A), atingiu parcialmente (AP) ou não atingiu (NA) e no fim do ano, mesmo o aluno que não atingiu o mínimo esperado será APROVADO. Então pergunto: Para que a SED nos exige tão árduo trabalho, se ao final do ano NÓS, professores, NÃO seremos soberanos em nossa decisão de Aprovar ou Reprovar??? A SED sabe mais do que eu , professora que passou o ano inteiro com o aluno, fez seu trabalho, exigiu, chamou os pais, conversou, alertou, explicou, revisou, porém não obteve melhora no desempenho da criança??? Nós educadores, fazemos de tudo e mais um pouco pelo aluno que não está atingindo os objetivos propostos em sala, por aquele que se mostra desinteressado pelos estudos; pois sempre insistimos com ele, recuperamos os conteúdos, refazemos atividades e provas, e muito mais.
Não dispomos de todos os recursos para tornarmos a aprendizagem mais significativa e interessante, pois isso depende de investimentos do estado em materiais que já citei acima. Além disso, precisaríamos 2 profissionais por turma nas séries iniciais,especialmente 1◦ e 2◦ano, um PROFESSOR REGENTE MAIS UMA AUXILIAR para assim dar conta daqueles que apresentam maiores dificuldades,mas isso gera gastos (3,4, 5 diretores numa única escola não!) Sem falar que há muitos casos de crianças com atrasos mentais leves ou traumas psicológicos que interferem na aprendizagem e que isso não lhes dá direito ao segundo professor. E assim a coisa caminha sem mudança e sem resultados positivos para essas crianças. Nós sabemos perfeitamente que há mais coisas que fogem ao nosso controle. Há outras que dependem também da cobrança da família e da presença desta na vida escolar dos filhos. Há casos em que o aluno vem 2 dias e falta 3 na semana…o professor não opera milagres. Assim, ás vezes nossos esforços não são suficientes para recuperar a defasagem de um aluno e É NECESSÁRIO REPROVAR SIM. Passar o problema a diante não resolve nada, a criança sofre ainda mais porque não consegue acompanhar os demais colegas e se sente excluída. É devido a essa política do “empurra pra série seguinte” que alunos estão chegando às séries finais lendo e escrevendo pessimamente mal. Porém, é preciso considerar que o REPROVAR para EXCLUIR é péssimo, inadequado, injusto e inútil. É preciso haver todo um trabalho em torno deste aluno para que seja atendido mais de perto em suas necessidades no ano seguinte. Assim, gostaria de saber o que pensam os mais experientes, já que estou apenas 8 anos em sala. Como estão vendo esse novo sistema dos 9 anos? Corrijam-me no que eu estiver errada, mas é meu desabafo, minha angústia.

Abraços! Margot Schütz Kammers.”

Fonte: blog do Moacir Pereira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário